quinta-feira, 8 de agosto de 2013

Excitando-nos até a morte (por Russell D. Moore)

Bookmark and Share Bookmark and Share

O casal tipicamente começa me falando sobre como suas vidas são estressantes. Talvez ele tenha perdido o emprego. Talvez ela tenha dois. Talvez suas crianças sejam descontroladas e o lar é caótico. Mas normalmente, se conversarmos por tempo suficiente, há uma sensação de que algo mais está errado. O casal vai me falar sobre como a vida sexual se aproxima da extinção.  O homem, ela me dirá, é um abismo emocional, frio na intimidade com sua esposa. A mulher está frustrada, o que parece para ele como uma mistura de raiva e humilhação. Eles só não sabem o que está errado, mas sabem que um casamento cristão não deveria ser assim.

É nesse ponto que eu interrompo a discussão, olho para o homem e pergunto: “Então, tem quanto tempo que a pornografia está aí?”. O casal vai se olhar, então olharão pra mim com uma incredulidade temerosa que deixa no ar o questionamento “Como você sabe?”. Por alguns minutos, eles tentam se recompor diante dessa exposição, imaginando, penso eu, se eu sou um profeta do Antigo Testamento ou um psíquico da Nova Era. Mas não sou nenhum dos dois. E ninguém precisa ser para perceber o espírito de nossa época. Nos nossos dias, a pornografia é o anjo destruidor do Eros (especialmente o masculino), e é hora da igreja enfrentar o horror dessa verdade.

Uma perversão do que é bom

De certa forma, o problema da pornografia não é nada novo. A cobiça humana por uma sexualidade anti-pactual está firmada, nos diz Jesus, não em algo externo a nós, mas em nossas paixões caídas (Mateus 5.27-28). Cada geração de cristãos tem enfrentado a questão da pornografia, seja a arte pagã referente a Dionísio, as dançarinas da Era do Jazz ou as revistas de porno-chanchada das décadas de 40 e 50.

Mas a situação é diferente agora. A pornografia agora não está simplesmente disponível. Com o advento da tecnologia da Internet, com seu alcance praticamente universal e suas promessas de privacidade, a pornografia se militarizou. Em alguns setores, especialmente entre a população jovem masculina, ela é praticamente universal. Essa universalidade não é, ao contrário do que dizem os próprios donos dessa indústria, um sinal de sua inocência, mas de seu poder.

Como qualquer pecado, a pornografia é, por definição, uma perversão do que é bom, nesse caso, o mistério do homem e da mulher juntos em uma união de um corpo só. A inclinação para isso é forte de fato, precisamente por que nosso Criador, em infinita sabedoria, decidiu que as criaturas humanas não se subdividiriam como uma ameba, mas que o homem precisaria da mulher, e a mulher, do homem, para a sobrevivência da espécie.

Além disso há um mistério maior ainda. O Apóstolo Paulo nos diz que a sexualidade humana não é arbitrária nem é meramente natural. Ela é, ele diz, em si mesma, um ícone do propósito final de Deus no evangelho. Essa união em um corpo só é uma figura da união de Cristo com sua Igreja (Efésios 5.22-23). E a sexualidade humana é submissa ao padrão do próprio Alfa e Ômega do cosmos, não é de se espantar que ela seja tão difícil de conter. E que aparente ser tão difícil de controlar.

Uma questão eclesiástica

A pornografia, por sua própria natureza, leva à instabilidade. Uma imagem guardada na memória nunca será suficiente para continuar excitando um homem. Deus, afinal de contas, criou o homem e a mulher de forma que se satisfaçam não com um único ato sexual, mas com um apetite constante um pelo outro, pela união procriativa e unitiva de carne com carne e alma com alma. Alguém que busca esse mistério além da união pactual nunca encontrará o que procura. Ele nunca encontrará em uma imagem nua o suficiente para satisfazê-lo.

Sim, a pornografia é uma questão de moralidade pública. Nós já falamos sobre isso repetidas vezes. Uma cultura que não resguarda a dignidade da sexualidade humana é uma cultura que caminha para o niilismo. Sim, a pornografia é uma questão de justiça social. Afinal de contas, a pornografia, pelo que sabemos hoje, é raramente só “algumas imagens”. Por trás dessas imagens estão pessoas de verdade, criadas à imagem de Deus, que, por meio de uma triste jornada a uma terra de desespero, se rebaixaram a isso. Nós concordamos com aqueles – mesmo com aquelas feministas seculares de quem tanto discordamos – que dizem que uma cultura pornográfica fere a mulher e as crianças, através da objetificação das mulheres, do tráfico de crianças e da “produtificação” do sexo.

Mas antes de ser uma questão legal, cultural ou moral, a pornografia é uma questão eclesiástica. O julgamento, como nos dizem as Escrituras, deve começar na casa de Deus (1 Pedro 4.17). O homem que está no andar de cima vendo pornografia enquanto sua esposa leva seus filhos para o treino do futebol pode até ser um guerreiro sem religião da cultura secular. Mas também é possível que ele seja membro de uma das nossas igrejas, talvez até um dos que lê a revista Touchstone [N. T.: revista onde esse texto foi veiculado originalmente].

Para começar a tratar dessa crise, convocamos a igreja de Jesus Cristo a tratar de forma séria o que está em risco aqui. A pornografia é mais do que impulsos biológicos ou niilismo cultural; é uma questão de adoração. A Igreja cristã, em todos os lugares e em todos os tempos e em todas as situações, tem ensinado que não estamos sozinhos no universo. Um aspecto do “cristianismo puro e simples” é que existem seres espirituais invisíveis por todo o cosmos que buscam nos atacar.

Esses poderes entendem que “quem peca sexualmente peca contra o seu próprio corpo” (1 Coríntios 6.18). Eles entendem que uma ruptura no laço matrimonial sexual mancha a personalização da figura de Cristo e sua Igreja (Efésios 5.32). Eles sabem que a pornografia na vida de um seguidor de Cristo é como se unisse Cristo, espiritualmente, a uma prostituta eletrônica ou, mais provável, um vasto harém de prostitutas eletrônicas (1 Coríntios 6.16). E esses poderes acusadores sabem que aqueles que praticam essas coisas sem se arrepender “não herdarão o Reino de Deus” (1 Coríntios 6.9-10).

Falso arrependimento

Isso significa que nossas igrejas não podem simplesmente contar com grupos de apoio e softwares de bloqueio parental para combater essa praga. Devemos enxergar isso como algo profundamente espiritual e, acima de tudo, restabelecer uma visão cristã da sexualidade humana. A pornografia na internet, afinal de contas, é pura conseqüência de uma visão da sexualidade humana egoísta e infrutífera. Em uma era em que o sexo significa meramente atingir o orgasmo usando qualquer meio possível, devemos reafirmar o que a Igreja cristã sempre ensinou: o sexo é uma figura da união pactual de um homem com uma mulher, uma união cuja intenção é fazer florescer o amor, a alegria e, sim, o prazer sexual.

Mas ele também serve para representar nova vida. Uma visão cristã da sexualidade, arraigada no mistério do evangelho, é o que há de mais distante da feiura utilitarista da pornografia. Nosso primeiro passo deve ser mostrar por que a pornografia deixa uma pessoa, e uma cultura, tão adormecida e vazia. A sexualidade humana é, como meu colega Robert George colocou, mais do que “partes do corpo pressionadas umas nas outras”.

Mais ainda, devemos clamar por arrependimento em nossas igrejas, e isso é mais difícil do que parece. A pornografia traz consigo um tipo de falso arrependimento. Imediatamente após um “episódio” de pornografia “terminar”, o participante normalmente, em especial no começo, sente um tipo de remorso e de repulsa por si mesmo. Um adúltero ou um fornicador do tipo mais tradicional pelo menos podem racionalizar e dizer que está “apaixonado”. A maioria das pessoas, apesar disso, não escreve poesia ou músicas românticas sobre essa compulsão isolada da masturbação. Mesmo pagãos que acham a pornografia agradável e necessária parecem reconhecer que isso é um tanto quanto patético.

Tipicamente, para aqueles que se identificam como cristãos, um episódio pornográfico é seguido por uma resolução de “nunca mais fazer isso de novo”. Muitas vezes (de novo: tipicamente) esses homens prometem buscar algum tipo de apoio e deixar o hábito pra trás.  Mas normalmente essa resolução diz menos sobre uma consciência pesada do que sobre um apetite saciado. Mesmo Esaú, com a barriga cheia de ensopado, chorou por seu direito de primogenitura perdido, mas “não teve como alterar a sua decisão, embora buscasse a bênção com lágrimas.” (Hebreus 12.17).

Sem arrependimento genuíno, o ciclo da tentação continuará. Os poderes dessa era vão colaborar com os impulsos biológicos para fazê-la parecer irresistível novamente. O pseudo-arrependimento manterá o pecado apenas escondido. Isso é obra do diabo e está entre as coisas que nosso Senhor Jesus veio destruir (1 João 3.8).

Genuíno arrependimento

Nossas igrejas precisam mostrar como é o arrependimento genuíno. Isso não significa estabelecer regras e regulamentos legalistas contra o uso da tecnologia. Isso, nos diz o Apóstolo Paulo, “não têm valor algum para refrear os impulsos da carne” (Colossenses 2.23). Isso de fato significa, entretanto, que cada fonte de tentação vem com um meio de escape correspondente (1 Coríntios 10.13). Para alguns membros especialmente vulneráveis de nossas igrejas. Isso significar abrir mão do uso de computadores pessoais ou da internet como um todo.

Essa sugestão pode parecer absurda para muitos, como se nós estivéssemos sugerindo que alguns cristãos fariam bem ao parar de comer ou dormir. Mas os seres humanos já viveram milhares de anos sem computadores e sem a Internet. Estaria nosso Senhor Jesus certo quando diz que é melhor cortar a mão ou retirar um olho do que sermos condenados por nossos pecados? (Mateus 5.29). Não é muito menor que isso pedir para alguém cortar apenas um cabo?

Também devemos fortalecer as mulheres em nossas congregações para agirem como cristãs com seus maridos escravizados pela pornografia. Nós cremos, e ensinamos enfaticamente, que as mulheres devem se submeter a seus maridos (Efésios 5.23). Mas nas Escrituras e nos ensinamentos cristãos, toda submissão (exceto aquela a Deus) tem limites. O corpo do marido, diz a Bíblia, pertence à sua esposa (1 Coríntios 7.4). Ela não precisa se submeter a ser um alvo físico das fantasias pornográficas de seu marido. Se ambos são membros de uma igreja cristã, e ele não se arrepende, nós aconselhamos a esposa a seguir os passos que Jesus estabeleceu (Mateus 18.15-20) para chamar um irmão ao arrependimento, que levam até a ação da igreja.

A resposta do evangelho

Finalmente, e mais importante, chamamos a igreja a contra-atacar a pornografia com aquilo que os poderes demoníacos mais temem: o evangelho de Jesus Cristo. Jesus, afinal de contas, andou conosco e, antes de nós, passou por essas tentações. O seu inimigo (que também é nosso inimigo) ofereceu a ele uma refeição solitária “masturbativa”, no meio de um jejum no deserto. Jesus recusou a oferta de Satanás, não porque ele não estava com fome, mas porque ele queria um banquete matrimonial, junto de sua Igreja como “preparada como uma noiva adornada para o seu marido” (Apocalipse 21.2).

Esses poderes querem qualquer filho de Adão, especialmente um irmão ou irmã do Senhor Jesus, sofrendo debaixo de acusações. Através da confissão de pecados, entretanto, qualquer consciência, incluindo aquela obscurecida pela pornografia, pode ser purificada. Pelo sangue de Cristo, recebido em arrependimento e fé, nenhuma acusação satânica pode permanecer, nem mesmo aquela que vem do histórico de navegação da internet.