Charles Cunningham Boycott (12 de março de 1832 - 19 de junho de 1897) foi um inglês que trabalhou na Irlanda como capataz para Lorde Erne. Em 1880, ativistas locais da Irish Land League incentivaram os funcionários de Boycott (incluindo os trabalhadores sazonais que colhiam nas fazendas de Lord Erne) a pararem de trabalhar, e iniciaram uma campanha de isolamento contra o Boycott na comunidade local. Nessa campanha lojas também se recusaram a atendê-lo.
É muito comum que, devido a atitudes de indivíduos ou entidades que desagradem a outros indivíduos ou entidades, estes últimos se mobilizem para protestar através de boicotes.
Por outro lado, há os que se queixam desse tipo de mobilização, e o taxam de censura.
- Quem estaria correto nessa discussão??
- Como identificar o que é de fato censura do que é boicote??
- Há algo inerentemente mal em qualquer tipo de boicote??
Para tentarmos chegar a respostas convincentes a tais questões, antes é necessário analisarmos o que de fato significam, no nosso idioma:
censura e boicote.
CENSURA:
cen·su·ra
1. Ato ou efeito de censurar.
2. Crítica severa, repreensão.
3. Exame oficial de certas obras ou escritos.
4. Corporação a que compete esse exame.
5. Pena eclesiástica que priva os fiéis dos bens espirituais.
"censura", in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa [em linha], 2008-2013, https://priberam.pt/dlpo/censura [consultado em 27-10-2017].
boi·co·te |ôi| (inglês boycott, de [Charles C.] Boycott [proprietário irlandês que, no século XIX, viu os seus arrendatários recusarem trabalhar devido à sua severidade e exigências desmedidas])
1. Ato ou efeito de boicotar. = BOICOTAGEM
2. Cessação voluntária de todas as relações com um indivíduo, uma empresa ou uma nação. = BLOQUEIO
boi·co·tar(inglês to boycott, recusar-se a cooperar)
1. Recusar, como forma de protesto ou represália, qualquer colaboração ou relação.
2. Fazer guerra comercial (a determinados produtos).
3. Impedir a realização ou o desenvolvimento de algo.Sinônimo Geral: BOICOTEAR
"boicote", in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa [em linha], 2008-2013, https://priberam.pt/dlpo/boicote [consultado em 27-10-2017].
Por mais que alguém possa confundir as definições por ambas trazerem a ideia de rejeição a algo praticado ou disseminado, não é tão difícil perceber a diferença entre ambos conceitos.
A censura está relacionada a um juízo negativo (uma crítica, repreensão) quanto a algo, e principalmente com proibição coerciva do acesso a tal coisa.
Já no caso do boicote, existe também um juízo negativo, mas geralmente está relacionado com o desejo voluntário do(s) indivíduo(s) e a mobilização para que mais ajam da mesma forma, mas sem coerção que impeça o autor daquilo que gerou o protesto.
Uma boa definição de boicote foi dada por Murray N. Rothbard em seu livro "A ética da liberdade":
"Um boicote é uma tentativa de persuadir outras pessoas a não se envolverem com alguma pessoa ou firma específica - seja suspendendo as relações sociais ou concordando em não comprar os produtos da firma. Moralmente, um boicote pode ser usado por motivos absurdos, repreensíveis, louváveis ou neutros. Ele pode ser usado, por exemplo, para tentar persuadir as pessoas a não comprar as uvas de produtores não sindicalizados ou a não comprar as uvas de produtores sindicalizados. Do nosso ponto de vista, a questão importante a respeito do boicote é que ele é puramente voluntário, um ato de tentativa de persuasão, e, portanto, que ele é um instrumento de ação perfeitamente legal e lícito."[1]
Ou seja, apesar de alguns se queixarem de atos de boicote, atrelando isso à censura (e seu aspecto social reprovável), a única semelhança entre ambos se dá no direito que cidadãos livres têm de demonstrar sua reprovação a algo. Isso porque qualquer pessoa deve ter o direito de livre consciência e, portanto, não deve ser impedido coercivamente de expressar sua opinião sobre algo, considerando tal coisa certa ou errada, boa ou má, etc.
Porém, a censura ganha outros contornos quando imposta por autoridades.
Quando o juízo negativo quanto a algo se transforma em proibição legal ao acesso àquilo, qualquer semelhança com a ideia de boicote "morre".
Poderíamos dizer que qualquer lei proibitiva é uma censura a algo condenável civilmente. Por exemplo, se é proibido roubar, entende-se que o roubo é inerentemente mau e portanto impede-se através de punição quem o pratica.
Dessa forma o roubo é socialmente censurado, mas a garantia disso está no poder das autoridades de punir quem age contrariamente a essa norma.
Sendo assim, aquele que se apresenta contra qualquer tipo de censura, é (por estupidez e/ou ignorância) um louco, que nega a necessidade de leis e ordem. Só terá a razão se for contra censura injusta, ou seja, a censura contra algo que não deveria ser censurado.
Por sua vez, um boicote representa apenas a intenção de alguém ou um grupo de não "financiar" certas práticas. Não sendo portanto uma proibição legal que torna tal coisa um crime, mas simplesmente uma atitude que visa não dar apoio àquilo.
Partindo desse pressuposto, qualquer pessoa deve ser livre (perante as leis) para boicotar qualquer coisa que em sua consciência julgue ser desagradável, indevida ou até imoral. Sendo também válido que tal pessoa tenha a liberdade de convocar mais pessoas para protestar da mesma forma, e infligirem um impacto maior.
Tomando um exemplo concreto, se uma empresa fornece determinado produto e em seu marketing abraça ideologias condenadas por parte de seus consumidores, é totalmente válido que tal grupo de consumidores se reúna e deixe de consumir tal produto dessa empresa e passe a consumir de outra, gerando então um prejuízo que pode levar essa empresa a repensar e até abandonar seu apoio aberto a tais ideologias. Afinal, se não fosse assim, por que o bordão "o cliente sempre tem razão" seria tão respeitado pelas empresas??
Tendo então em mente a distinção entre censura e boicote, e considerando nosso dever cristão de submeter nossas consciências à Palavra de Deus, existiriam situações em que temos o dever de realizar um boicote??
Mas apesar de ser um bom indicativo de não ser algo obrigatório, a falta de exemplos bíblicos não significa necessariamente que a prática seja incorreta. Do contrário usar a internet ou jogar futebol seriam coisas proibidas a um cristão (para dar exemplos).
Sendo assim, legalmente ninguém deveria ser punido por boicotar qualquer um por qualquer motivo, mas para validar a prática de boicote moralmente é necessário identificarmos os princípios que tal prática poderia estar infringindo e também se a motivação da mesma estaria correta ou não. E ao fazermos tal análise podermos constatar que 1) não há impedimento bíblico para um cristão voluntariamente optar por deixar de consumir algum produto ou serviço e 2) se a intenção for de não colaborar com a disseminação do que a bíblia condena (e não meramente por 'vingança' ou desejo de prejudicar alguém); então é possível sim realizar boicote sem pecar.
Mas como proceder em um mundo caído??
Um cristão deveria boicotar "tudo"??
Aliás, além de uma opção, o boicote é uma obrigação aos cristãos??
Troque 'marca X' por alguma outra que tenha gerado uma polêmica recente e talvez se recorde de algum apelo desse tipo. Usualmente pessoas influentes (especialmente no meio gospel) adotam postura semelhante, convocando evangélicos a protestarem contra determinadas marcas.
Isso é válido para um cristão??
Eu diria que sim, mas se (e somente se), for algo sugestivo e não impositivo.
A partir do momento que algum "entusiasta" do boicote sugerisse que todos temos a obrigação de participar ou emitisse qualquer tipo de ameaça da parte de Deus caso não façamos, configura-se claramente o legalismo.
Esse "entusiasta" poderia até se esforçar em convencer pessoas a aderirem ao boicote através de argumentos lógicos, mas jamais deveria tentar forçar alguém a isso. A voluntariedade é um ponto-chave na validade do boicote.
Porém, a censura ganha outros contornos quando imposta por autoridades.
Quando o juízo negativo quanto a algo se transforma em proibição legal ao acesso àquilo, qualquer semelhança com a ideia de boicote "morre".
Poderíamos dizer que qualquer lei proibitiva é uma censura a algo condenável civilmente. Por exemplo, se é proibido roubar, entende-se que o roubo é inerentemente mau e portanto impede-se através de punição quem o pratica.
Dessa forma o roubo é socialmente censurado, mas a garantia disso está no poder das autoridades de punir quem age contrariamente a essa norma.
Sendo assim, aquele que se apresenta contra qualquer tipo de censura, é (por estupidez e/ou ignorância) um louco, que nega a necessidade de leis e ordem. Só terá a razão se for contra censura injusta, ou seja, a censura contra algo que não deveria ser censurado.
Por sua vez, um boicote representa apenas a intenção de alguém ou um grupo de não "financiar" certas práticas. Não sendo portanto uma proibição legal que torna tal coisa um crime, mas simplesmente uma atitude que visa não dar apoio àquilo.
Partindo desse pressuposto, qualquer pessoa deve ser livre (perante as leis) para boicotar qualquer coisa que em sua consciência julgue ser desagradável, indevida ou até imoral. Sendo também válido que tal pessoa tenha a liberdade de convocar mais pessoas para protestar da mesma forma, e infligirem um impacto maior.
Tendo então em mente a distinção entre censura e boicote, e considerando nosso dever cristão de submeter nossas consciências à Palavra de Deus, existiriam situações em que temos o dever de realizar um boicote??
BOICOTE É BÍBLICO??
Ao tentar localizar textos na Escritura em que a prática foi realizada, não me recordei de nenhum, e acredito que não haja exemplos mesmo disso acontecendo plenamente. Até me recordei de uma instrução divina dada por intermédio de Paulo, alertando os crentes a não comerem alimentos que foram oferecidos a ídolos, mas o motivo era evitar o escândalo de terceiros e não o de gerar prejuízo ao vendedor idólatra...Mas apesar de ser um bom indicativo de não ser algo obrigatório, a falta de exemplos bíblicos não significa necessariamente que a prática seja incorreta. Do contrário usar a internet ou jogar futebol seriam coisas proibidas a um cristão (para dar exemplos).
Sendo assim, legalmente ninguém deveria ser punido por boicotar qualquer um por qualquer motivo, mas para validar a prática de boicote moralmente é necessário identificarmos os princípios que tal prática poderia estar infringindo e também se a motivação da mesma estaria correta ou não. E ao fazermos tal análise podermos constatar que 1) não há impedimento bíblico para um cristão voluntariamente optar por deixar de consumir algum produto ou serviço e 2) se a intenção for de não colaborar com a disseminação do que a bíblia condena (e não meramente por 'vingança' ou desejo de prejudicar alguém); então é possível sim realizar boicote sem pecar.
Mas como proceder em um mundo caído??
Um cristão deveria boicotar "tudo"??
Aliás, além de uma opção, o boicote é uma obrigação aos cristãos??
O BOICOTE E O LEGALISMO
"Todos devem parar de comprar a 'marca X'".Troque 'marca X' por alguma outra que tenha gerado uma polêmica recente e talvez se recorde de algum apelo desse tipo. Usualmente pessoas influentes (especialmente no meio gospel) adotam postura semelhante, convocando evangélicos a protestarem contra determinadas marcas.
Isso é válido para um cristão??
Eu diria que sim, mas se (e somente se), for algo sugestivo e não impositivo.
A partir do momento que algum "entusiasta" do boicote sugerisse que todos temos a obrigação de participar ou emitisse qualquer tipo de ameaça da parte de Deus caso não façamos, configura-se claramente o legalismo.
Esse "entusiasta" poderia até se esforçar em convencer pessoas a aderirem ao boicote através de argumentos lógicos, mas jamais deveria tentar forçar alguém a isso. A voluntariedade é um ponto-chave na validade do boicote.
O EXTREMO DA ISENÇÃO
Se por um lado há o erro do legalismo, no extremo oposto temos o erro da isenção (para não dizer "frouxidão"), quando as pessoas desconsideram a ideia de protestar alegando que isso não tem qualquer efeito prático, mas geralmente o fazem apenas para não saírem das suas zonas de conforto.
Reitero que boicotar deve ser um ato voluntário, e portanto ninguém deve ser "demonizado" caso opte não fazê-lo, mas como eu também disse, a motivação é sempre um requisito essencial no julgamento de tudo aquilo que fazemos. Dessa forma, se a motivação que leva a pessoa a deixar de protestar é meramente evitar algum desconforto, mesmo havendo motivos fortes para ela demonstrar sua insatisfação, certamente está errada.
Esse tipo de motivação comodista se apoia muitas vezes na ideia de que "o mundo jaz no maligno" (I João 5:19), e geralmente traz consigo um pensamento "entreguista", onde a pessoa acredita que não adianta fazer nada tendo em vista que "o mundo é do diabo".. Esse pensamento despreza na prática o chamado "mandato cultural", e ignora que mesmo que o mundo (sistema) esteja corrompido e cegado pelo mal, temos sim o dever cristão de desejar transformação.
Para mais textos relacionados, acessar:
Outro texto (mal) usado como base para o "entreguismo" está em 1 Pedro 2:11: Amados, peço-vos, como a peregrinos e forasteiros, que vos abstenhais das concupiscências carnais, que combatem contra a alma. Muitos se apegam ao fato de sermos peregrinos neste mundo, mas desconsideram que ainda assim somos cidadãos dele.
O apóstolo Paulo vivenciou situações em que não abriu mão de sua "cidadania terrena", e temos isso registrado nas Escrituras. Diante das injustiças sofridas, ele se aproveitou dos benefícios de sua cidadania romana:
O tribuno mandou que o levassem para a fortaleza, dizendo que o examinassem com açoites, para saber por que causa assim clamavam contra ele. E, quando o estavam atando com correias, disse Paulo ao centurião que ali estava: É-vos lícito açoitar um romano, sem ser condenado?
E, ouvindo isto, o centurião foi, e anunciou ao tribuno, dizendo: Vê o que vais fazer, porque este homem é romano.
E, vindo o tribuno, disse-lhe: Dize-me, és tu romano? E ele disse: Sim.
E respondeu o tribuno: Eu com grande soma de dinheiro alcancei este direito de cidadão. Paulo disse: Mas eu o sou de nascimento.
E logo dele se apartaram os que o haviam de examinar; e até o tribuno teve temor, quando soube que era romano, visto que o tinha ligado. E no dia seguinte, querendo saber ao certo a causa por que era acusado pelos judeus, soltou-o das prisões, e mandou vir o principais dos sacerdotes, e todo o seu conselho; e, trazendo Paulo, o apresentou diante deles.
(Atos 22:24-30)
Se o apóstolo abrisse mão de sua cidadania, não sabemos o que poderia lhe ocorrer, mas havia a possibilidade de ter sido morto mediante a acusação dos judeus (como aconteceu com Jesus Cristo). Mas ele se aproveitou desse recurso para garantir seus direitos e com isso teve oportunidades de pregar o evangelho no seu próprio julgamento. Portanto, temos no exemplo do apóstolo uma base para negarmos que nossos direitos civis devem ser deixados de lado.
E tendo tais direitos, nos dias atuais garantidos pela Constituição e leis de forma geral, faz todo o sentido recorrermos quando eles são infligidos. Assim como é justo que usemos nosso direito de sermos ouvidos, quando decisões forem tomadas pelas autoridades, visto sermos parte de um sistema democrático.
Além do "entreguismo" já exposto, a isenção também ocorre em pensar que é impossível se abster do mal devido ao mundo estar corrompido. Mas faria sentido pensar assim mesmo lembrando das palavras de Cristo??
Por exemplo, José e Daniel, foram figuras de destaque em meio a sociedades pagãs, mas nem por isso abriram mão de seus princípios com a desculpa de que era inevitável pecar. Da mesma forma, estamos todos no mundo, mas o mundo (mundanismo) não deve estar em nós (Romanos 12:1-2).
Aplicando isso ao contexto de consumo, se um crente sabe que ao fazer isso estará pecando, seu "boicote" não se torna uma opção. Por exemplo, se um filme ou série traz cenas impróprias e o crente sabe disso, ele não deve consumir com a desculpa de que "o mundo jaz no maligno" e que "teria que sair do mundo" pra evitar o pecado, deve sim deixar de assistir. E tal regra valeria pra qualquer tipo de produto ou serviço.
Por outro lado, mesmo ciente de intenções pecaminosas daquele que fornece o produto ou o serviço, o cristão pode consumir caso possa usar como ferramenta para fazer o bem. Em tese, alguns poderiam questionar que tal cristão estaria ainda assim dando lucro a quem está disseminando o pecado, mas na verdade esse cristão pode ter em mente redimir o uso. Por exemplo, mesmo que pessoas por trás de redes sociais apoiem causas anti-bíblicas e até a disseminem, cristãos podem usar sabiamente essas redes (e a internet em geral) para disseminar o evangelho. Talvez um exemplo dessa "redenção do uso" seja encontrada no livro de Êxodo, quando os judeus saíram do Egito levando bens dos egípcios que outrora eram usados para idolatria, e viriam a ser usados para fins puros.
Sejamos todos equilibrados, e julguemos tudo segundo a reta justiça (João 7:24).
Quando a isenção é pecaminosa
Conforme mencionei anteriormente, qualquer tipo de lei civil punitiva contem em si um tipo de censura, proibindo que algo seja feito. No cristianismo, sabemos que tudo aquilo que Deus condena deve ser evitado, logo, para um cristão tudo aquilo que é pecaminoso não deve ser praticado.Além do "entreguismo" já exposto, a isenção também ocorre em pensar que é impossível se abster do mal devido ao mundo estar corrompido. Mas faria sentido pensar assim mesmo lembrando das palavras de Cristo??
Dei-lhes a Tua palavra, e o mundo os odiou, porque não são do mundo, assim como eu não sou do mundo.Não peço que os tires do mundo, mas que os livres do mal.
Não são do mundo, como eu do mundo não sou.(João 17:14-16)
Portanto, se a tua mão ou o teu pé te escandalizar, corta-o, e atira-o para longe de ti; melhor te é entrar na vida coxo, ou aleijado, do que, tendo duas mãos ou dois pés, seres lançado no fogo eterno.E, se o teu olho te escandalizar, arranca-o, e atira-o para longe de ti; melhor te é entrar na vida com um só olho, do que, tendo dois olhos, seres lançado no fogo do inferno.Da mesma forma que Cristo reconhece que 'o mundo é mau' mas que precisamos permanecer aqui com a condução do Pai, Ele instrui Seus seguidores a fazerem o necessário para combater o pecado. Sendo assim não há base para "afrouxar a santidade"...
(Mateus 18:8-9)
Por exemplo, José e Daniel, foram figuras de destaque em meio a sociedades pagãs, mas nem por isso abriram mão de seus princípios com a desculpa de que era inevitável pecar. Da mesma forma, estamos todos no mundo, mas o mundo (mundanismo) não deve estar em nós (Romanos 12:1-2).
Aplicando isso ao contexto de consumo, se um crente sabe que ao fazer isso estará pecando, seu "boicote" não se torna uma opção. Por exemplo, se um filme ou série traz cenas impróprias e o crente sabe disso, ele não deve consumir com a desculpa de que "o mundo jaz no maligno" e que "teria que sair do mundo" pra evitar o pecado, deve sim deixar de assistir. E tal regra valeria pra qualquer tipo de produto ou serviço.
Por outro lado, mesmo ciente de intenções pecaminosas daquele que fornece o produto ou o serviço, o cristão pode consumir caso possa usar como ferramenta para fazer o bem. Em tese, alguns poderiam questionar que tal cristão estaria ainda assim dando lucro a quem está disseminando o pecado, mas na verdade esse cristão pode ter em mente redimir o uso. Por exemplo, mesmo que pessoas por trás de redes sociais apoiem causas anti-bíblicas e até a disseminem, cristãos podem usar sabiamente essas redes (e a internet em geral) para disseminar o evangelho. Talvez um exemplo dessa "redenção do uso" seja encontrada no livro de Êxodo, quando os judeus saíram do Egito levando bens dos egípcios que outrora eram usados para idolatria, e viriam a ser usados para fins puros.
E eu darei graça a este povo aos olhos dos egípcios; e acontecerá que, quando sairdes, não saireis vazios, porque cada mulher pedirá à sua vizinha e à sua hóspeda jóias de prata, e jóias de ouro, e vestes, as quais poreis sobre vossos filhos e sobre vossas filhas; e despojareis os egípcios.
(Êxodo 3:21-22)
Fala agora aos ouvidos do povo, que cada homem peça ao seu vizinho, e cada mulher à sua vizinha, jóias de prata e jóias de ouro. E o Senhor deu ao povo graça aos olhos dos egípcios; também o homem Moisés era mui grande na terra do Egito, aos olhos dos servos de Faraó e aos olhos do povo.Outra situação a ser considerada é quando, mesmo que não estiver pecando ao consumir o produto ou serviço, o próprio serviço ou produto seja realizado de forma pecaminosa.
(Êxodo 11:2-3)
Tomando o mesmo exemplo de filmes e séries, mesmo que alguém alegue que não peca ao assistir cenas indevidas ou que evita ver essas partes e se atem ao resto, se quem contracenou pecou a pessoa está apoiando ou ao menos tolerando isso sem qualquer protesto.
Se um filme apresenta por exemplo cenas de nudez e sexo, independentemente da reação do expectador, aqueles que realizaram a cena pecaram, e certamente estarão levando outros a pecar...
Sugestão de leitura: Devo/posso assistir nudez deliberadamente?
CONCLUSÃO
Penso que esse não é um texto exaustivo que "fecha" todas as possíveis questões sobre o tema, mas espero que ele pelo menos esclareça alguns pontos e conduza os interessados num caminho mais lógico e bíblico.
Se você tende ao legalismo, baseando-se nas suas fortes fome e sede de justiça, cuide para não impor a terceiros aquilo que Deus não cobra delas. Aplique primeiro na sua vida aquilo que você crê contribuir para sua santidade, mas sempre colocando a própria providência de Deus como o fator crucial para conseguir crescer na caminhada.
Se você tende à "frouxidão", analise suas motivações e o quanto se dedica às causas do Reino. Avalie se sua "abstenção" está relacionada com um julgamento justo da causa ou com um comodismo que visa evitar qualquer desconforto na sua vida, incluindo conflitos com quem pensa diferente. Pense que se os antigos cristãos pensassem todos assim, a nossa sociedade seria eternamente pagã nos mesmos moldes que era antes do cristianismo ser espalhado pelo mundo. "Post Tenebras Lux" nunca seria algo conhecido por nós.
E que DEUS nos ajude!!
[1] « O Boicote ». A ética da liberdade. São Paulo. Instituto Mises Brasil 2010. p. 199