terça-feira, 18 de março de 2014

O Sínodo de Dort (por Juliano Heyse) parte 02 de 03

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James Arminius

Armínio nasceu em 1560, no sul da Holanda. Estudou em Genebra com Beza, o sucessor de Calvino. Tornou-se ministro em Amsterdam em 1588. Não foram seus escritos, mas sim sua pregação que começou a chamar a atenção por não parecer muito ortodoxa. Ele decidiu fazer uma pregação expositiva no livro de Romanos. Sua interpretação de boa parte dos primeiros textos do livro surpreendeu seus ouvintes. Mas foi no capítulo 7 que ele trouxe sobre si uma avalanche de protestos. O texto de Romanos 7:14-15 diz: "Porque bem sabemos que a lei é espiritual; eu, todavia, sou carnal, vendido à escravidão do pecado. Porque nem mesmo compreendo o meu próprio modo de agir, pois não faço o que prefiro, e sim o que detesto.". Armínio propôs que esse texto se referia a uma pessoa não regenerada, contrariando o que os principais exegetas reformados sempre defenderam, ou seja, que Paulo falava sobre si mesmo, na condição de cristão. Ao pregar em Romanos de 8 a 11, ele enfatizou o tempo todo o livre arbítrio do homem e ao chegar a Romanos 13, afirmou que o Estado tinha a suprema autoridade em assuntos eclesiásticos e religiosos.

Por conta de tudo isso, um de seus colegas, Petrus Plancius, registrou denúncia contra ele para que ele fosse investigado pelo consistório. Havia rumores sobre o novo ensino em todo o país. Armínio, no entanto, confirmava pleno compromisso com a Confissão Belga e com o Catecismo de Heidelberg. No entanto, ficava cada vez mais evidente que ele tinha problemas com o artigo 16 da confissão, o qual afirmava a doutrina da eleição.

Em 1602 surgiu uma vaga na famosa Universidade de Leiden, para suceder um de seus principais professores de teologia, morto pela praga que assolava a Holanda naquele ano. Alguém indicou o nome de James Arminius para sucedê-lo. Havia uma preocupação quanto à ortodoxia de Armínio, e portanto a sua aceitação foi condicionada a uma entrevista com o Dr. Franciscus Gomarus sobre os pontos chaves da doutrina. Gomarus era um famoso Calvinista, profundo conhecedor da Palavra. Diante de diversos comissários, Armínio rejeitou publicamente diversas doutrinas pelagianas quanto a graça natural, livre arbítrio, pecado original e predestinação. Também prometeu jamais ensinar qualquer coisa em desacordo com a doutrina oficial das igrejas. Assim sendo, ele foi aceito como Professor de Teologia da Universidade de Leiden.

Em suas aulas públicas, Armínio permaneceu firme nas suas promessas. Mas em aulas particulares, a alunos selecionados, ele expressava francamente suas dúvidas e questionamentos. Esses alunos foram fortemente influenciados por ele e começaram a propagar alguns desses ensinamentos. Por onde iam, questionavam a doutrina reformada, atacando-a de diversas formas.

Armínio permanecia afirmando estar em pleno acordo com a doutrina reformada enquanto disseminava seus novos pontos de vista nos bastidores. Seus adversários o condenam fortemente por demonstrar absoluta falta de caráter fazendo um tipo de "jogo-duplo". Ao mesmo tempo, seus defensores o elogiam dizendo que tudo o que ele fez foi pensando sempre na unidade da universidade e das igrejas. O leitor pode decidir por si mesmo.

Arminius versus Gomarus

A intranqüilidade aumentava e em 1607 o sínodo da Holanda do Sul recebeu queixas contra os ensinamentos de Armínio. O sínodo convocou James Arminius e o colocou mais uma vez frente a frente com Franciscus Gomarus e os dois expuseram e compararam seus pontos de vista. Mais uma vez Armínio alegou total fidelidade à Confissão Belga e como os delegados não conseguiram perceber grandes diferenças entre o que foi exposto por Arminius e por Gomarus, recomendaram que houvesse tolerância mútua. Outra conferência foi convocada em 1609, também não redundando em avanços. Naquele mesmo ano Armínio morreu de tuberculose.

Os Cinco Artigos do Arminianismo

Com a morte de Armínio, sua causa passou a ser liderada por Johannes Uitenbogaard e Simon Episcopius. Em 1610, sob a liderança de Uitenbogaard, os arminianos se reuniram e elaboraram uma representação (remonstrance - por isso são conhecidos até hoje como os remonstrantes). Nela os arminianos atacavam algumas doutrinas calvinistas e estabeleceram 5 artigos com suas próprias posições:
1. A eleição está condicionada à previsão da fé. 
2. Expiação universal (Cristo morreu por todos os homens e por cada homem, de forma que ele conquistou reconciliação e perdão para todos por sua morte na cruz, mas só os que exercem a fé podem gozar desse benefício).
3. Necessária a regeneração para que alguém seja salvo (aparentemente, uma visão perfeitamente ortodoxa, mas mais tarde ficou claro que a visão deles era tal que negava fortemente a depravação da natureza humana).
4. A possibilidade de resistir à graça.
5. A incerteza quanto à perseverança dos crentes (mais tarde eles deixaram claro que não criam de forma alguma na garantia da perseverança).

Os artigos foram assinados por 46 ministros.

Os calvinistas responderam com uma reafirmação da doutrina calvinista. Formou-se o grupo conhecido na história como os contra-remonstrantes. Isso ocorreu em 1611.

A convocação do Sínodo

O poder público não ficou indiferente à controvérsia que ganhava contornos cada vez mais perigosos. Havia pessoas que estavam utilizando a controvérsia religiosa para incitar rebeliões e outras formas de ação política. Assim, em 11 de novembro de 1617, Maurício de Nassau decidiu que um sínodo nacional deveria ser convocado em 1 de novembro de 1618. Estava criado o quadro para o surgimento do famoso Sínodo de Dort.

Encorajado pelo Rei Tiago I da Inglaterra, o governo central holandês enviou convites a diversos representantes de países reformados para que enviassem delegados para participarem do sínodo. O governo holandês requisitava a cada país que fossem enviados alguns de seus teólogos mais renomados, de proeminente erudição, santidade e sabedoria, que com seu conselho e juízo pudessem trabalhar diligentemente para apaziguar as diferenças que tinham surgido nas igrejas da Holanda, trazendo paz àquelas igrejas.

Outro motivo para convidar os teólogos estrangeiros, foi a tentativa de garantir a isenção que os remonstrantes alegavam que a igreja da Holanda não possuia. Uma terceira razão estava ligada ao fato dos remonstrantes alegarem continuamento ao povo que as demais igrejas protestantes compartilhavam da mesma visão que eles. A presença dos delegados estrangeiros poderia dirimir esta e outras dúvidas.