segunda-feira, 24 de junho de 2013

História falaciosa (por Carl Trueman)

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Extraído de: iprodigo (Reforma21)
Uma das mais fortes, mas invisíveis, ameaças ao pensamento cristão, no presente momento, é a da história falaciosa. Como monóxido de carbono, ela pode matar; só que você não nota que isso está acontecendo até que seja tarde demais. História falaciosa se mostra de muitas formas. As mais óbvias e influentes são aquelas veiculadas pela cultura popular. Filmes são os principais culpados aqui. A estética do cinema moderno é tão poderosa que as histórias que os filmes contam podem ser convincentes simplesmente porque parecem muito reais. Assim, se houver um filme em que os americanos decifram o código Enigma na Segunda Guerra mundial, então o senso comum será, bem, que os americanos decifraram o código Enigma (na verdade, foram os britânicos que o fizeram).
Os livros têm uma influência também, especialmente aqueles que vêm combinados com um filme bem produzido. Pense no Código Da Vinci, por exemplo. Dan Brown no diz no livro que a igreja só concordou em afirmar a divindade de Cristo por uma margem apertadíssima e como resultado de pressões políticas. A verdade é mais prosaica: enquanto houve um certo componente político nos debates trinitarianos do quarto século, o resultado final foi alcançado por meio de argumentos, e por ampla maioria.
Velhas fofocas ou, para usar uma terminologia mais “politicamente correta”, mitos urbanos, também têm o seu papel em moldar o entendimento popular do passado. Que João Calvino queimou Miguel Serveto na fogueira em Genebra certamente é verdade, mas está longe de ser a verdade completa. Uma maior atenção à vida de Serveto revela que ele era procurado por Católicos tanto quanto por Protestantes, e que Calvino tentou mudar sua execução para a decapitação, como um pequeno ato de misericórdia. Sem querer perdoar Calvino ou minimizar a sujeira do que aconteceu, as ações de Calvino simplesmente não foram uma exceção aos padrões da época, um ponto que deveria pesar em nosso julgamento do ocorrido.
O cristianismo é, obviamente, uma religião histórica. Paulo fala sobre isso claramente ao tratar da ressurreição: se Cristo não ressuscitou (no tempo e no espaço), então somos, de todos os homens, os mais dignos de pena (1 Coríntos 15.19). A igreja também é um fenômeno histórico: suas ações, seus credos e confissões, tudo que ela já fez é histórico. Todos os cristãos, portanto, deveriam ser historiadores.
À luz disso, precisamos ser bons historiadores para podermos reconhecer os boatos e as falácias quando os vemos. Porém, não há nenhum segredo para ser um bom historiados. Basta um pequeno conjunto de habilidades que podem ser aprendidas como quaisquer outras, como tocar piano e fazer bolos.
Dessa forma, há um grande número de coisas que os cristãos deveriam manter em mente quando leem livros de história, particularmente aqueles que falam sobre a história do Cristianismo.
Primeiro, lembre-se que história é uma narrativa do passado construída com base em evidências. Assim, quando ler sobre história, sempre questione: quais evidências estão sendo citadas? De fato, há alguma evidência sendo citada? De que tipo? São testemunhos oculares? É um documento escrito? E essas evidências são capazes de sustentar a narrativa que está sendo oferecida? Por exemplo, um bilhete de trem na bolsa de uma mulher pode indicar que ela viajou de Nova York para Washington em Dezembro. Mas se essa é a única evidências da viagem, e mesmo assim o historiados afirma que ela foi para Washington e se encontrou com o presidente dos Estados Unidos, o leitor pode, legitimamente, questionar a narrativa.
Segundo, lembre-se de que o historiador pressuposições. Isso não significa que todas as histórias podem ser simplesmente reduzidas ao ponto de vista do autor. O racista que nega o Holocausto sequer aconteceu não oferece uma narrativa tão justa quando a do escritor judeu que afirma que ele aconteceu. Entretanto, o judaísmo do escritor judeu, sem dúvida, irá moldar até certo ponto como ele analisa das evidências. Quando Dan Brown escreveu suas baboseiras sobre o Concílio de Nicéia, seu desejo de escrever um best seller e atacar a fé cristã, foi, sem dúvidas, um fator forma como ele escolheu e interpretou as evidências.
Terceiro, leia o máximo de boa história que você conseguir. Vivemos uma excelente época para ler história. Semanalmente eu recebo um e-mail da Amazon.com me informando dos últimos livros que foram publicados na seção de história. Raramente se passa uma semana em que eu não me sinto tentado a digitar o número do meu cartão de crédito e comprar um novo volume. O período nem importa: os cânones da boa história, em termos de analisar e interpretar evidências, são os mesmos tanto para histórias da Grécia antiga quanto para o Nicarágua contemporâneo. Ler boa história te auxiliará a reconhecer a ruim quando você encontrá-la.
O Cristianismo precisa de cristãos que conheçam boa história. Boa história ajuda a edificar nossa confiança em nossa religião histórica e a oferecer uma resposta aos maus historiadores – e há muitos deles.