domingo, 22 de janeiro de 2017

A Eternidade dos Tormentos do Inferno (por Jonathan Edwards) - parte 01 de 03

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Traduzido do original em inglês: The Eternity of Hell's Torments
Jonathan Edwards © Domínio Público
Original disponível em: www.APURITANSMIND.com
Tradução e Produção: www.FirelandMissions.com
Primeira edição: Setembro de 2013.




  • Pregado por Jonathan Edwards em abril de 1739.



"Estes irão para o castigo eterno" 
(Mt 25:46)

Neste capítulo temos a mais singular descrição do dia do juízo de toda a Bíblia. Aqui Cristo declara que, futuramente, quando Ele se assentar no trono de Sua glória, o justo e o ímpio serão postos perante Ele e separados uns dos outros, assim como o pastor separa as ovelhas dos bodes (cf. Mt 25:31-32).

Em seguida temos um relato de como ambos serão julgados segundo as suas obras: como as boas obras de um e as más obras de outro serão repassadas, e como a sentença será anunciada de acordo com elas. Somos informados de qual será a sentença de cada um, e então temos uma descrição da execução da sentença de ambos. Nas palavras do texto está o relato da execução da sentença do imoral ou ímpio, e concernente a esta, tenho por objetivo observar duas coisas.

Primeiro, a duração do castigo no qual é dito que eles entrarão: este é chamado castigo eterno.

Segundo, o momento da entrada deles neste castigo eterno. A saber, após o dia do julgamento, quando todas as coisas que são passageiras tiverem chegado ao fim, e até mesmo aquelas que são as mais duradouras a estrutura do próprio mundo, a terra da qual é dito que permaneceria para sempre, as antigas montanhas e eternas colinas, o sol, a lua e as estrelas. Quando os céus envelhecerem como um vestido e como roupas forem trocados (cf. Sl 102:25-26), aí será o momento em que o perverso entrará em seu castigo.

Doutrina: O Tormento dos Ímpios no Inferno Será Absolutamente Eterno.

Há dois conceitos contra os quais eu pretendo me posicionar com esta doutrina. Um deles é que a morte eterna com a qual os ímpios são ameaçados na Bíblia não significa nada mais do que a aniquilação eterna: que Deus punirá a maldade deles através da abolição eterna de seu ser.

O outro conceito contra o qual pretendo me posicionar é que, embora o castigo dos ímpios consista no justo tormento, ele não será absolutamente eterno, mas apenas por um grande período de tempo.

Portanto, a fim de estabelecer a doutrina em oposição a esses conceitos distintos, eu me comprometerei a mostrar que:

I. Não é contrário às perfeições divinas punir os ímpios com um castigo que é absolutamente eterno;

II. A morte eterna com a qual Deus ameaça o ímpio não é a aniquilação, mas uma justa e permanente punição ou tormento;

III. Este tormento não continuará somente por um grande período de tempo, mas será absolutamente sem fim;

IV. Diversos fins excelentes serão obtidos por meio do castigo eterno dos ímpios.


I. Não é Contrário às Perfeições Divinas Punir os Ímpios Com Um Castigo Que É Absolutamente Eterno.

Esta é a soma das objeções que geralmente são feitas contra esta doutrina: ela é inconsistente com a justiça e, especialmente, com a misericórdia de Deus. E alguns dizem que se ela for terminantemente justa, ainda assim, como podemos supor que um Deus misericordioso pode eternamente suportar o tormento de suas criaturas?

Primeiro, irei mostrar rapidamente que não é incompatível com a justiça de Deus infligir um castigo eterno. Para evidenciar isso, vou usar apenas um argumento: o pecado é abominável o suficiente para merecer tal punição, e tal punição não é nada mais do que proporcional ao mal ou a culpa pelo pecado. Se o mal do pecado for infinito, como a punição o é, então é evidente que a punição não é mais do que proporcional ao pecado punido, e não é nada mais do que o que o pecado merece. E se a obrigação de amar, honrar e obedecer a Deus for infinita, então o pecado, que é a violação dessa obrigação, é a violação de uma obrigação infinita, e portanto é um mal infinito. Novamente, se Deus for infinitamente digno de amor, honra e obediência, então nossa obrigação de amar, honrar e obedecer-Lhe é infinitamente grande de modo que, Deus sendo infinitamente glorioso ou infinitamente digno de nosso amor, honra e obediência, a nossa obrigação de amar, honrar e obedecer-Lhe (e assim evitar todo o pecado) é infinitamente grande. Novamente, sendo a nossa obrigação amar, honrar e obedecer a Deus infinitamente grande, o pecado é a violação de uma obrigação infinita, e assim é um mal infinito. E mais uma vez, sendo o pecado um mal infinito, ele merece um castigo infinito. Um castigo infinito não é nada mais do que o que ele merece. Portanto tal punição é justa; que era o que deveria ser provado. Não há como fugir da força deste raciocínio, a não ser negando que Deus, o soberano do universo, é infinitamente glorioso, o que eu presumo que nenhum de meus ouvintes vai se aventurar a fazer. 

Segundo, mostrarei que não é incompatível com a misericórdia de Deus punir os ímpios com um castigo eterno. É uma noção irracional e antibíblica da misericórdia de Deus, que Ele é misericordioso a tal ponto que não pode suportar que a justiça penal seja executada. Isto é imaginar a misericórdia de Deus como uma paixão da qual sua natureza está tão sujeita que Deus é passível de ser mudado, afetado, e subjugado ao ver uma criatura no tormento, de modo que Ele não pode suportar ver a justiça sendo executada: o que é uma noção extremamente indigna e absurda da misericórdia de Deus; e que provaria, se fosse verdade, uma grande fraqueza seria um grande defeito, e não uma perfeição, no soberano e supremo Juiz do mundo, ser misericordioso a tal ponto de não poder suportar ter a justiça penal executada. Esta é uma noção antibíblica da misericórdia de Deus. As Escrituras em toda a parte expõem a misericórdia de Deus como sendo livre e soberana; e não que a prática dela seja tão necessária a ponto de Deus não poder suportar que a justiça seja feita.
As Escrituras abundantemente falam dela como sendo a glória do atributo divino da misericórdia, que ela é livre e soberana em suas práticas; e não que Deus não pode fazer nada a não ser libertar os pecadores do tormento. Esta é uma noção extremamente indigna e medíocre da misericórdia divina.

É mais absurdo ainda, porque é contrária à realidade natural. Pois, se há algum sentido na objeção, é presumível nisto, que todo o tormento da criatura seja justo ou injusto é em si mesmo contrário à natureza de Deus. Pois, se a Sua misericórdia for de natureza tal, que um grande grau de tormento apesar de justo é contrário à sua natureza; então basta aumentar a misericórdia. E em seguida, um grau menor de tormento é contrário à sua natureza bastando aumentar novamente a misericórdia, e um grau ainda menor de tormento, continua contrário à sua natureza. Portanto, se a misericórdia de Deus é infinita, qualquer tormento é contrário à sua natureza, o que vemos ser contrário à realidade. Pois vemos que Deus, em sua providência, de fato, inflige grandíssimas aflições sobre a humanidade, mesmo nesta vida.

Entretanto, fortes objeções desse tipo. contra o tormento eterno dos ímpios, podem
parecer aos carnais homens de coração insensato como se o tormento fosse contrário a justiça e misericórdia de Deus; todavia a sua força aparente surge de uma falta de senso do mal infinito, da odiosidade e da provocação que há no pecado. Por isso, parece-nos não ser adequado que qualquer pobre criatura seja objeto de tanto tormento, porque não temos nenhum senso de algo que é abominável e provocante em qualquer criatura responsável por isso. Se tivéssemos, então esta aflição infinita não pareceria inadequada. Pois uma coisa apenas pareceria correspondente e proporcional a outra, e assim a mente descansaria nisto como sendo justo e apropriado, e nada mais do que é próprio de ser ordenado pelo justo, santo e bom Governador do mundo.

Podemos ser convencidos disso por esta consideração, quando ouvimos ou lemos alguns casos horrendos de crueldade, pode ser de alguma pobre criança inocente ou algum santo mártir seus cruéis perseguidores, não tendo nenhuma consideração por seus gritos e choros, apenas se divertindo com o tormento deles, e não tendo misericórdia nem mesmo para pôr um fim às suas vidas nós temos uma compreensão do mal deles, e isso nos marca profundamente. Por isso parece justo em todos os sentidos, adequado e apropriado que Deus inflija um castigo terrível sobre as pessoas que tenham cometido tal perversidade. Não parece discordar em nada da perfeição do Juiz do mundo. Podemos pensar nisso sem nos chocarmos completamente. A razão é porque temos um senso do mal da conduta deles, e um senso da relação que existe entre o mal ou culpa, e a punição. 

Da mesma forma, se víssemos a relação entre o mal do pecado e o castigo eterno, ou seja, se víssemos algo nos homens maus que pareceria tão odioso para nós quanto o tormento eterno nos parece terrível algo que nos instigaria tanta indignação e repulsa, quanto o tormento eterno nos aterroriza todas as objeções contra esta doutrina desapareceriam de uma só vez. Embora agora pareça inconcebível, e quando ouvimos falar do tamanho do grau e da duração dos tormentos como é manifestado nesta doutrina, e pensamos o que é a eternidade, parece impossível que tais tormentos devam ser infligidos à pobres e débeis criaturas por um Criador que tem infinita misericórdia. No entanto, isto origina-se, principalmente, destas duas causas:

1. Esta doutrina é tão contrária às inclinações depravadas da humanidade, que os homens odeiam acreditar nela e não conseguem suportar que isso seja verdade.

2. Eles não veem o castigo eterno como apropriado por causa do mal do pecado.
Eles não veem que o castigo eterno não é nada mais do que proporcional à culpa do pecado.

Tendo assim demonstrado que o castigo eterno dos ímpios não é inconsistente com as perfeições divinas, vou agora prosseguir mostrando o quão distante isto está de ser inconsistente com as perfeições divinas e que estas perfeições evidentemente exigem o mesmo, ou seja, elas exigem que o pecado receba tão grande castigo, ou na pessoa que tenha cometido ou no fiador. E, portanto, com relação aos que não creem no Fiador (cf. Hb 7:22, 25; Cl 2:1314), e não têm interesse n'Ele, as perfeições divinas requerem que esta punição seja infligida neles.
Não apenas parece que não é inadequado que o pecado seja punido desta maneira, mas é terminantemente adequado, aceitável e próprio. Se assim parecer, que é terminantemente adequado que o pecado seja punido desta maneira, então se seguirá que as perfeições de Deus exigem o mesmo. Pois certamente as perfeições de Deus requerem que aquilo é adequado seja realizado. A perfeição e excelência de Deus exigem que aconteça aquilo que é perfeito, excelente e bom em sua própria natureza. Mas com respeito ao pecado ter de ser castigado eternamente, é algo que aparece nas seguintes considerações:

1. É apropriado que Deus odeie infinitamente o pecado, e seja um eterno inimigo dele. O pecado, assim como demonstrei anteriormente, é um mal infinito, e portanto, é infinitamente odioso e detestável. É apropriado que Deus odeie todo o mal e que o odeie de acordo com sua natureza odiosa e detestável. E uma vez que o pecado é infinitamente mau e odioso, é apropriado que Deus o odeie infinitamente.

2. Se o ódio infinito ao pecado for adequado ao caráter divino, logo as expressões de tal ódio também são adequados a este personagem. Pois aquilo que é adequado de ser, é adequado de ser expressado. Aquilo que é belo em si mesmo, é belo quando demonstrado. Se for adequado que Deus é um eterno inimigo do pecado, ou que Ele o odeie infinitamente, então é adequado que Ele haja como tal inimigo. Se for adequado que Ele odeie e tenha inimizade contra o pecado, então é adequado que Ele expresse este ódio e inimizade àqueles a quem o ódio e a inimizade por sua própria natureza tendem. Mas, certamente, o ódio em sua própria natureza tende a oposição, a se opor contra aquilo que é odiado e a procurar o seu mal, e não o seu bem, e isto de acordo com o ódio. Grande ódio tende naturalmente para um grande mal, e infinito ódio ao infinito mal de seu alvo.

Por isso se sucede que, se é adequado que deve haver em Deus um infinito ódio ao pecado, como eu mostrei que é, é adequado que Ele execute um castigo infinito sobre ele. E portanto, a perfeição de Deus exige que Ele puna o pecado com um infinito, ou o que é a mesma coisa, com um eterno castigo.

Assim, vemos não somente a grande objeção contra esta doutrina respondida, mas a verdade da doutrina estabelecida por meio da razão. Eu agora prossigo a fim de estabelecê-la, considerando os demais elementos sob a doutrina.