segunda-feira, 8 de agosto de 2016

Escola Sem Partido ou Escola Sem Estado??

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(Trecho da música "Another Brick In The Wall", da banda "Pink Floyd")

Uma discussão atual (07/2016) diz respeito ao esforço de alguns visando mudanças no sistema educacional para que, na teoria, não haja a chamada "doutrinação" por parte dos educadores, ao "encucarem" nos alunos suas ideologias e inclusive formar militantes.

O Movimento Escola Sem Partido apresenta em seu programa medidas contra o uso do sistema educacional como mecanismo de formação de pessoas alienadas, desde cedo. Combate portanto, a indução por parte dos educadores, e defende uma neutralidade dos mesmos no processo de ensino.

Eis abaixo a proposta (extraída do site):
O Programa Escola sem Partido é uma proposta de lei que torna obrigatória a afixação em todas as salas de aula do ensino fundamental e médio de um cartaz com o seguinte conteúdo:


Analisando cada um destes pontos é difícil entender como alguém seria contra essa proposta, principalmente quando boa parte desses opositores são os mesmos que até pouco tempo zombavam da ideia de que existe de fato um processo de doutrinação nas escolas.. 
Quero dizer, se o que o programa propõe é neutralidade, e tais opositores afirmam que existe neutralidade, qual seria o motivo de rejeitarem uma lei que apenas a assegure??

Além disso, há outro fator que torna o combate a essa proposta ainda mais estranho. O próprio site mostra isso:
Esses deveres já existem, pois decorrem da Constituição Federal e da Convenção Americana sobre Direitos Humanos. Isto significa que os professores já são obrigados a respeitá-los ‒ embora muitos não o façam ‒, sob pena de ofender: 
  • a liberdade de consciência e de crença e a liberdade de aprender dos alunos (art. 5º, VI e VIII; e art. 206, II, da CF);  
  • o princípio constitucional da neutralidade política, ideológica e religiosa do Estado (arts. 1º, V; 5º, caput; 14, caput; 17, caput; 19, 34, VII, 'a', e 37, caput, da CF);  
  • o pluralismo de ideias (art. 206, III, da CF); e  
  • o direito dos pais dos alunos sobre a educação religiosa e moral dos seus filhos (Convenção Americana sobre Direitos Humanos, art. 12, IV). 
Portanto, o único objetivo do Programa Escola sem Partido é informar e conscientizar os estudantes sobre os direitos que correspondem àqueles deveres, a fim de que eles mesmos possam exercer a defesa desses direitos, já que dentro das salas de aula ninguém mais poderá fazer isso por eles.


Ou seja, o que os opositores estão fazendo de fato é combater uma simples proposta de aplicação real daquilo que já é previsto em lei. Isso por si só é a própria demonstração de que eles não cumprem tais proposições, e que não querem ser cobrados quanto a isso. É a própria prova de que há MUITOS educadores que são na verdade "fabricantes de militantes", e no próprio site do Escola Sem Partido foram postados exemplos de professores que abertamente "confessam" agir assim.

Esse vídeo traz bons argumentos sobre o motivo de partidos e sindicatos se mobilizarem contra o projeto:




De qualquer forma, ainda assim quero comentar sobre cada um dos pontos.
(colocarei abaixo apenas os comentários numerados, sendo que cada ponto pode ser lido na imagem acima).

1) Qual é o sentido de alguém que defende a neutralidade no ensino ser contra a ideia de que o professor não use de sua autoridade e influência para "pregar" suas próprias opiniões??

Se o ensino público é financiado por todos, supõe-se que o interesse de todos deva ser considerado e, portanto é injusto que um professor dissemine sua visão sobre um grupo de alunos ao invés de se abster em nome da neutralidade.
Aliás, não é o próprio socioconstrutivismo que coloca o professor como mero "facilitador" no aprendizado ao invés de um "transmissor de conhecimento"?? Se esse é o padrão mais aclamado pelos pedagogos brasileiros (mesmo sendo um pensamento errado), por que nesse caso esses pedagogos que rejeitam o programa preferem abraçar essa contradição??

2) Qual o sentido de alguém que defende a neutralidade no ensino ser contra a ideia de que o professor não use de sua autoridade para punir alunos com pensamentos diferentes dos seus??

Se a escola é um espaço de debates (como alguns dos opositores afirmaram), quem poderia ser a favor de um professor punir (o que vai desde dar nota baixa até a atacar psicológica ou fisicamente) um(a) aluno(a) porque o(a) mesmo(a) afirmou (verbalmente ou por escrito) algo que tal professor julga ser errado conforme sua própria ideologia ou convicções pessoais??
Sendo assim, como poderia um professor, por exemplo, dizer que um(a) aluno(a) está errado(a) quando é requerido deste(a) uma resposta que envolva questões morais ou mesmo política?? Caberia a um professor "neutro" dizer que um(a) aluno(a) está errado(a) por ser cristão ou capitalista, por exemplo?? 
A única "régua" que tal professor poderia utilizar para algum tipo de julgamento seria o conjunto de leis vigentes no país e em em sua região, mas JAMAIS algo que venha de sua própria convicção pessoal ou de algum grupo ao qual pertence.


3) Qual o sentido de alguém que defende a neutralidade no ensino ser contra a ideia de que o professor não use de sua autoridade e influência para induzir ou inflamar alunos a tomarem posturas políticas conforme SUA visão??

Se deve haver neutralidade, quem pode negar que "propaganda eleitoral" vinda de educadores e o chamado à participação política feito de forma bem específica e partidária é contraditório??
Seria válido sim que tal educador explicasse de forma neutra e considerando inclusive diferentes visões sobre um mesmo fato, para que os seus alunos decidissem ser participativos ou não, mas JAMAIS induzi-los conforme uma única visão da realidade.

4) Esse ponto está bastante relacionado ao que comentei acima.

O professor precisaria ser bem-preparado para que transmitisse aos seus alunos possíveis interpretações diferentes de um mesmo fato, segundo visões diferentes da realidade.
Isso sim seria neutralidade, mas exigiria no mínimo um bom conhecimento das visões mais populares/conhecidas, seja na área da economia, da política e das relações sociais em geral.
Por exemplo, para falar sobre monarquia um professor deveria considerar a visão de quem é contra e quem é a favor da mesma. Ao narrar fatos históricos, deveria usar fontes que interpretassem os mesmos de formas diferentes e chegassem a conclusões diferentes (quando fosse o caso).

Utópico demais??

Nem chegamos ao final dos itens, aguentaí..

5) Qual o sentido de alguém que defende a neutralidade no ensino ser contra a ideia de que são os pais e não o Estado quem deve educar moralmente as crianças e adolescentes do país??

Leis civis são proibições que sempre carregam consigo uma imposição moral, mas podem ser vagas, e não necessariamente um cidadão deve encarar como certo ou errado o que o Estado diz que é certo ou errado.


Um bom exemplo histórico para essa minha última afirmação é o Apartheid, que ocorreu na África do Sul. Lá, havia leis que afirmavam e mantinham a segregação racial, impedindo negros de ter acesso a ambientes e recursos que eram destinados a brancos. Ou seja, o fato do Estado dizer que, por exemplo, negros não deveriam usar os mesmos bebedouros de brancos, não torna isso uma verdade absoluta e nem faz com que o ato de desobediência seja inerentemente mau em si mesmo.

(Figura ao ladoPlaca encontrada em uma praia de Durban, em 1989, indica - em inglês, africâner e zulu - se tratar de uma "área de banho reservada para uso exclusivo por integrantes do grupo racial branco".)


O próprio Estado precisa se submeter à Constituição (e em uma sociedade ideal às Escrituras), e no caso do Brasil há diferentes Poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário) que servem (em tese, quando não aparelhados) para evitar a tirania.

Mas outro ponto crucial é entender que, além do Estado não ser dono de seus cidadãos adultos, muito menos é dono das crianças. Os pais são os responsáveis por elas, e cabe a eles e não a terceiros lhes dizer o que é certo ou errado.

Por exemplo, quando Deus separou o povo judeu e lhes deu mandamentos e leis para que pudessem viver em sociedade e em santidade perante Ele, deixou clara a obrigação dos pais em "doutrinar" seus filhos sobre deveriam pensar e agir:
Ouça, ó Israel: O Senhor, o nosso Deus, é o único Senhor.Ame o Senhor, o seu Deus, de todo o seu coração, de toda a sua alma e de todas as suas forças.Que todas estas palavras que hoje lhe ordeno estejam em seu coração.Ensine-as com persistência a seus filhos. Converse sobre elas quando estiver sentado em casa, quando estiver andando pelo caminho, quando se deitar e quando se levantar.
(Deuteronômio 6:4-7)

Esse é um direito básico dos pais em relação aos seus filhos, mas que cada vez mais tem sido subvertido. Desde leis que impedem a disciplina que Deus delegou aos pais (como a "Lei da Palmada") até o uso da mídia e do sistema educacional para enfraquecer as figuras paternas e a ideia de que os filhos devem sujeição a eles, são exemplos de como cada vez mais a esfera familiar é desrespeitada e o Estado tende a tomar conta de tudo.

(O Estado só deveria intervir em casos em que a integridade da criança esteja em ameaça ou tenha sido atacada, punindo então o ofensor e, em casos extremos tirar a guarda dos pais caso estes estejam sendo negligentes em atender as necessidades básicas dessas crianças ou infringindo seus direitos humanos deliberadamente.)

E se o Programa Escola Sem Partido se mostra contra esse autoritarismo estatal, só posso entender que quem condena tal ponto é demasiadamente ignorante ou extremamente maligno a ponto de subverter a ordem natural das coisas. 
Ou quem sabe uma mistura de ambas as coisas.

6) Esse último ponto coloca o professor como peça chave para que nem mesmo terceiros realizassem tal abuso.

Nesse sentido a influência do(a) mesmo(a) poderia ter que sobrepôr a autoridade, caso um superior na hierarquia escolar (ou até mesmo em termos de cargos públicos) fugisse do proposto e descumprisse os 5 pontos, mas suponho que o programa esteja defendendo que esse educador deve ser protegido caso precisasse confrontar e impedir o abuso.
Coloca o professor como o grande responsável por proteger os alunos nesse sentido.



MAS ISSO RESOLVE??

Talvez alguns tenham abraçado a proposta integralmente considerando que é assim que o sistema educacional deve funcionar, mas eu espero não desapontar quem leu até aqui ao dizer que não acredito nisso..

E explico o porquê..

A verdadeira solução não é impedir a doutrinação nas escolas públicas, mas sim buscar o fim delas.


Piorei as coisas?? 
Sou maluco?? 
Não penso nos pobres??


Calma.., peço que prossiga a leitura.

Eu não acredito na possibilidade de educação sem doutrinação. A ideia de ensinar sem qualquer tendência, expondo todas as visões sobre um tema é pura ilusão, pois seria impossível que um educador transmitisse todas as visões possíveis (pela limitação natural que qualquer ser humano tem de conhecimento).
Além disso, não acredito que haja como afirmar uma possibilidade real de que a escola estatal fique "sem partido" quando é o partido no poder que define como essa escola vai funcionar. Ele a financia com dinheiro dos contribuintes, ele monta sua estrutura e diz o que ela deve ensinar.

Por isso, de fato, não é possível que tenhamos uma Escola PÚBLICA (ESTATAL) "sem Partido".

O que fazer então??

Prepare-se antes de ler:

O ensino deveria ser todo privado, e cada escola ser totalmente livre para ensinar o que quisesse, ao invés de serem sujeitas a um ministério que diz como a coisa toda tem que ser (MEC).

Os contrários ao Escola Sem Partido, curiosamente afirmam que tal projeto cercearia a liberdade, mas ao mesmo tempo geralmente combatem a ideia de ensino totalmente livre do MEC e a possibilidade do próprio ensino doméstico (homeschooling). O que mostra que, ou são muito confusos/limitados intelectualmente, ou que há interesse grande em que a doutrinação continue sendo feita como é hoje (obs.: se tiver alguma outra possibilidade eu não sei qual é..).

A ideia de um ensino todo privado e sem controle estatal permitiria de fato livres pensadores, no lugar de massa estudantil formada conforme a 'cartilha' que o próprio governo estipula.

Mas e os pobres??

O grande dilema quando se fala em privatizar um setor ao invés de deixar sob o controle estatal e com isso dar acesso a todos, é sobre como os mais necessitados seriam naturalmente impedidos de usufruírem dessas coisas.
Talvez até antes disso, exista um falso pensamento de que é um dever natural do Estado e que de fato é ele quem concede aquele serviço, ignorando-se a realidade de que o que ele faz (pessimamente mal) é simplesmente usar as arrecadações dos contribuintes (obrigados a pagar) e repassar isso para as várias áreas que ele controla, e a educação é uma delas. Dessa forma, o Estado não cria, não produz e nem dá nada, ele apenas administra o dinheiro que ele obriga as pessoas a pagarem, e determina então quanto e como investir na área educacional, por exemplo.
O que ocorre então é que os mais pobres não estão recebendo ensino gratuito, mas simplesmente um retorno daquilo que eles e todo o resto da sociedade já pagaram através dos "infinitos" impostos com os quais o próprio Estado os sobrecarrega.

Alguns podem pensar que isso é ruim mas que é a única opção para que os pobres talvez sejam alcançados, mas existem ideias muito melhores e sem a necessidade de um sistema educacional estatal. 

Por exemplo: como os mais pobres não teriam como pagar ensino privado, o governo poderia dar vales que servissem para elas inscreverem seus filhos em escolas privadas.

Ou seja, ao invés do Estado cuidar da Educação do início ao fim e usar (e superfaturar) dinheiro de impostos construindo escolas, pagando professores, diretores, inspetores (e mais um monte de funcionários), fornecendo material escolar, uniforme, etc.; ele simplesmente daria às pessoas mais necessitadas um valor (em forma de vale) que somente seria aceito em instituições de ensino e serviria para que as próprias pessoas escolhessem as escolas particulares em que desejariam ver seus filhos estudando. As próprias pessoas estariam livres para escolher escolas segundo as metodologias aplicadas, a capacidade dos professores, a qualidade do material, etc. Até mesmo o fator confessionalidade poderia ser um critério de escolha, podendo os pais escolherem escolas que ensinam aos seus filhos de acordo com o mesmo padrão moral que elas professam na igreja, e portanto o ensino religioso é ampliado.

Além portanto do fator liberdade, a própria concorrência livre entre as escolas faria que os responsáveis por elas tivessem que buscar reduzir preços e aumentar a qualidade para terem clientes. Coisa que a escola pública não tem e por isso nem precisa se preocupar em evoluir, além de costumeiramente gerar desperdícios.

A liberdade educacional garantiria aos responsáveis por uma criança a matricularem em escolas com métodos, recursos, capacitação e preço que eles julgassem ser adequados em uma comparação com as outras opções no mercado, ou até mesmo abriria espaço para eles mesmos ensinassem.

Mas isso também parece utópico, porque a própria Constituição trata a educação com um direito que deve ser assegurado pelo Estado. Portanto, para uma correção que gerasse mais liberdade e chance menor de corrupção e ineficácia, creio que a própria Constituição precisaria ser revista.

Finalizando, considerando o contexto em que estamos inseridos, eu votei SIM na consulta popular sobre o projeto Escola Sem Partido, como uma tentativa de diminuir e retardar esse abuso esquerdista, mas sabendo que isso nem de longe resolveria os problemas educacionais nesse sentido. Apoio a ideia do projeto entendendo que, mesmo que ele não resolva esse problema (por ser inviável), frearia essa doutrinação descarada que vemos nas escolas e que forma "papagaios" com poucos conhecimentos e baixa capacidade de argumentação.




Sugiro ainda a leitura deste artigo muito interessante sobre a relação entre educação e liberdade: 
Sobre a educação domiciliar: 
E sobre a relação do cristão com esses temas eu sugiro a leitura dos seguintes livros: